segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

As razões por que apóio Miguel Rossetto

Marco Aurélio Weissheimer

Conheci Miguel Rossetto em 2000, durante as primeiras reuniões que ocorreram em Porto Alegre para a organização da primeira edição do Fórum Social Mundial. Na época, ele era vice-governador e secretário geral de governo. Do governo Olívio Dutra. Na primeira conversa com as organizações não-governamentais e movimentos sociais que estavam à frente da organização do Fórum, Rossetto abraçou imediatamente a idéia, em nome do governo. Começou aí um trabalho frenético para viabilizar a primeira edição do encontro, em janeiro 2001. Quem viveu esse período deve lembrar que o governo Olívio Dutra vivia sob um pesado e sistemático ataque da direita gaúcha. Ataque por terra, ar e mar. Quem não lembra das manchetes diárias de Zero Hora denunciando o caos na segurança pública (armava-se então o picadeiro do circo da CPI), a militância diária de Lasier Martins procurando dar a linha para a oposição em seus espaços na rádio Gaúcha, na RBS TV e no Conversas Cruzadas.A primeira edição do Fórum Social Mundial ocorreu neste ambiente político. Em janeiro de 2001, um grupo de políticos e intelectuais críticos ao evento, ligados principalmente ao PMDB gaúcho, criou uma página na internet, com endereço praticamente idêntico ao da página oficial do FSM. O clone da página do Fórum tinha o objetivo explícito de sabotar as idéias do evento. Foi criado pelo Instituto Século XXI, cujo presidente, Flávio Presser, coordenaria mais tarde o plano de governo da campanha de José Fogaça para a prefeitura de Porto Alegre. Atacava o Orçamento Participativo, o Fórum Social Mundial e qualquer coisa que pudesse ser associada aos governos do PT no Rio Grande do Sul. O mesmo Presser criou o site Cidadania Urgente, que atacava sistematicamente o Fórum Social Mundial e o Orçamento Participativo. O então deputado Eliseu Santos, que seria vice de Fogaça, era um dos mais ácidos críticos do Fórum, chamado por ele de “encontro de terroristas, traficantes e seqüestradores”.
Resgatar essa memória é fundamental para entender o sentido da candidatura Fogaça que acabou saindo vitoriosa na eleição municipal de 2004. E para entender também o sentido da disputa política envolvida nas eleições deste ano. Fogaça e sua tropa de choque nunca gostaram do OP e do Fórum Social Mundial. Pelo contrário, as ações de Flávio Presser e Eliseu Santos, para citar apenas dois casos, falam por si. A tentativa de apropriação dessas experiências na campanha eleitoral, como se sabe, foi apenas uma tática eleitoral baseada no reconhecimento da popularidade delas junto ao povo gaúcho. Nos dias que correm sempre é importante chamar a atenção para algo que não é um detalhe: os governos do PT em Porto Alegre, no Estado e em outras cidades gaúchas não foram combatidos furiosamente pela direita pelos seus erros, mas sim pelos seus acertos. Acertos do ponto de vista de um programa de esquerda, obviamente.Ao longo dos 16 anos que governou Porto Alegre e dos quatro que governou o Rio Grande do Sul, o PT construiu uma nova agenda política no Estado. Após sucessivas derrotas, o conservadorismo gaúcho re-alinhou suas tropas, unificou ações e partiu para uma guerra sem tréguas e sem escrúpulos. Lembro bem o dia da leitura do relatório final da CPI da Segurança Pública, quando o então deputado estadual Vieira da Cunha “indiciou”, entre outros, o governador Olívio Dutra, o vice Miguel Rossetto, o chefe da Casa Civil, Flavio Koutzii e o secretário de Segurança Pública, José Paulo Bisol. Todos os pedidos de indiciamento foram arquivados pelo Ministério Público por falta de provas. Pouco importava. O objetivo político da CPI já havia sido atingido: desgastar o governo junto à população. Pouco importava também, no caso de Fogaça, se ele era de fato favorável ao OP e ao Fórum Social Mundial. Toda e qualquer mentira justificava-se pela necessidade de tirar o PT da prefeitura de Porto Alegre e do governo do Estado.Mas o que isso tudo tem a ver com as eleições municipais deste ano? Tem a ver com algo chamado “memória”. Ela, a memória, não é uma gaveta velha onde guardamos nossas coisas mais queridas e, volta e meia, a abrimos com um sentimento nostálgico. A memória é um espaço de organização do presente, que nos ajuda a entender quem somos, onde estamos e para onde vamos. A memória não é uma gaveta velha e a história não é sinônimo de passado. Por isso, resgatei essa memória relacionada ao período em que conheci Miguel Rossetto. De lá para cá, o PT sofreu pesadas derrotas. Derrotas políticas, eleitorais e mesmo morais. O desastre que representou a associação do partido com figuras como Marcos Valério custou muito caro. E o partido ainda pagará o preço dessa fatura por muito tempo. As coisas não voltarão a ser como antes, mas isso não significa que elas não podem melhorar.
Podem e devem melhorar. Não apenas porque a sobrevivência do PT como partido de esquerda depende disso. Devem melhorar porque Porto Alegre e o Rio Grande do Sul são governados hoje por uma lógica política contra a qual o PT nasceu. Por políticos que se unificaram para tentar destruir a grande experiência que a esquerda gaúcha (que vai além do PT) construiu nesta terra e que foi motivo de inspiração para a esquerda em vários cantos do mundo. É importante ter isso em mente nas eleições deste ano. Recentemente, o prefeito de Montevidéu, Ricardo Erlich, lembrou-nos disso: é muito importante para a América Latina que Porto Alegre volte a ser um ponto de referência para a esquerda. Que volte a ser governada pelo espírito que trouxe o Fórum Social Mundial para a cidade. Mas a eleição é importante, sobretudo, para o povo de Porto Alegre e do RS, que é governado hoje por choques de gestão, por lobbistas de grandes grupos empresariais e por comerciantes do interesse público.Assim, a decisão que o PT tomará no dia 16 de março tem a ver com a sua memória, com a sua história e com a compreensão do que ocorre aqui no estado e no país. A direita não atacará pessoalmente quem for o candidato do PT. Atacará o que esse candidato representa, a nossa história, o sentido das nossas políticas. Atacará fundamentalmente os nossos acertos ou, como fez Fogaça em 2004, tentará se disfarçar sob os nossos acertos. Sem essa clareza política, virá uma nova derrota. A história política recente do nosso Estado mostra isso. O PT ganhou eleições que as pesquisas diziam estar perdidas. Ganhou a confiança do povo com políticas combatidas ferozmente pela direita. Teve vitórias políticas e eleitoras, portanto, quando teve confiança na sua história e nos seus melhores acertos.Eu apóio a pré-candidatura de Miguel Rossetto na disputa interna do PT porque tenho confiança política naquilo que ela representa. Há valores que precisam ser afirmados aqui. A confiança é um deles. A experiência é outro. Experiência de governo, de vida. Experiência de quem já esteve, várias vezes, na linha de frente das batalhas contra a direita gaúcha. De quem enfrentou a dureza de ser ministro do governo Lula em uma área que é um terreno minado. De quem sempre entrou em bolas divididas, que fez escolhas que exigiram e exigem sacrifícios pessoais e políticos. De quem acredita que o objetivo da política não é a política em si mesma, mas melhorar a vida. Ela, a experiência, assim como a memória e a história, são valores, portanto, que definem a nossa vida, o nosso presente e futuro. É sobre isso que estaremos decidindo no dia 16 de março.

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